terça-feira, 30 de outubro de 2012

Diário De Carnaval


Diário de Carnaval

Abandono a terceira pessoa logo na primeira frase. Assim, como que em um diário, vou me transpor em letras sem vergonha, sem medo, sem receios de críticas ou conotações.
Algumas semanas antes do Carnaval comentei com algumas pessoas que seria meu último carnaval. – Calma! Não, não. Não vou morrer, não. (Pretendo, pelo menos. Já que esta é a única certeza que todos compartilhamos... que vamos partir um dia.) Mas o último no sentido da festa, da liberdade, da solteirice.
Bem cansada destes amores insípidos, inodoros, incolores e indolores... Estava bem empenhada a passar todos os outros carnavais acompanhada de alguém que, talvez, tivesse vontade de trocar uma noite de samba por filme e pipoca.
É verdade... Meus 27 anos tão bem vividos, sem nenhuma gota de arrependimento e muitas doses de intensidade, pesam e me cobram uma nova postura... Um novo sonho... Uma nova vida, talvez.  Casar, ter filhos. Cuidar do trabalho, da casa, dos filhos, do marido. Dosar as idas ao samba, à praia, ao rock... Uau! Tudo isto? E ainda parece melhor que estar sozinha?
Teimosa e cabeça dura. Perdi oportunidades e pessoas incríveis que eu poderia passar o resto da minha vida dosando as danças e as músicas, porque eram música e dança em presença na minha vida... Mas, não... Sempre achei que o bendito “amor” compartilhado deveria ser gigante e exageradamente verdadeiro! E hoje nem sei mais o que é de verdade...
Então, voltemos ao Carnaval. Insisti em uma viagem distante. Onde eu pudesse me ver longe do que tudo que já fui e ainda sou. Um lugar onde as paisagens pudessem preencher meus vazios e o sol pudesse bronzear cicatrizes e deformações, disfarçando a pele de quem já viveu tanto com só (agora só) 27 anos!
Eis que Florianópolis me presenteou com a graça da vista das praias, ilhas e me agraciou com Sol dourado durante oito dias! Me hospedei em um hostel. Era só para economizar, mesmo. Mas o Carnaval, meio que zombando com minha cara e todo aquele pensamento certinho acima, me brinda com novas pessoas. Ahhh... e como eu amo as pessoas, suas histórias, suas diferenças e suas particularidades.
Solteiras. Eram todas solteiras. E entre todas, as mais novas eram A (médica psiquiátrica, capixaba desbravadora de São Paulo), de 25 e eu, com 27.
Me encantei! A energia balzaquiana de uma contadora que se enfeita de minuto em minuto. Com a sua história de superação e mudança de vida. Depois de uma depressão profunda, renegou a condição de ser triste por tempo indeterminado e jogou tudo para o alto. Nova Vida era o nome do seu novo barco. E me deparei com uma mulher forte, determinada a ser feliz a qualquer custo, velejando em um mar de certezas onde a maior delas é: só depende dela! E com ela aprendi que eu posso morrer todos os dias, desde que eu renasça em uma nova vida. Com ela aprendi que é preciso renegar a algumas regalias para entrar neste novo barco, às vezes apertado e desconfortável, mas que te leva a aventuras incríveis sem preocupações de quanto tempo vai durar a viagem.
Da imagem frágil e sorriso doce, a revelação de uma microempresária bem sucedida e superação de histórias dolorosas. Chorei, sem vergonha, com sua história. Dez anos dedicados ao amor, ao relacionamento e um golpe fatal de realidade: era só um sonho de dez anos. 32 anos em carinha de 22 e no coração, o perdão de forma pura que nunca encontrei. Com seu castelo destruído, foi juntando os cacos reconstruindo sem pressa uma casa simples em bases mais sólidas. Encontrou sete estrelas e fez constelação no seu céu. E hoje vive sorrisos diferentes daqueles 10 anos. E em cada km rodado, se sente mais forte e, mesmo de encontro brusco com a realidade, não perdeu a capacidade de sonhar. Só não se precipita em realizar antes de sonhar. Com ela aprendi que perdoar é, também, se doar a si mesmo e se dar uma chance de apagar o passado de dor e guardar só o que existiu de bom.
Do susto, à surpresa. Ela tinha mesmo era cara de senhorita recém-casada. Mas estava lá, no quarto 40, no primeiro beliche e um armário desarrumado. Chegou fazendo barulho, acordando meu sono. Que coisa!
Tinha se mudado para aquele quarto naquele dia. E só por isso o armário estava uma “zona”. Depois, foi possível perceber o quanto era “arrumadinha”. Minhas bagunças eram muito maiores, como sempre. E não é que ela era solteira. Administradora, bióloga e funcionária pública. Dançarina, revelação do surf amador e, caramba!! É isto! Os 37 anos bem vividos da forma que sempre quis, construiu esta imagem de 29 que ela carrega num sorriso largo e numa fala mansa carregada de sotaque paulista. Meu Deus!! Ela estava ali tão feliz. Tão liberta. Tão exuberante. E com ela eu aprendi que a vida não segue uma linha de tempo como sempre nos ensinaram. Que eu não preciso marcar meu último carnaval, porque nada precisa ser último se tivermos vontade!
Ainda têm as cariocas lindas, loiras e bronzeadas. Com elas aprendi que o dia pode ser melhor que a noite quando a cidade tem mais gays lindos do que homens interessantes!
E a amiga de sempre. Aquela que antes dos 24 nem sabia sorrir. E hoje, com 29 recém-feitos, distribui sorrisos e quase se arrisca em uma super gargalhada. Mais desprendida, menos medrosa, quase bem humorada e o mesmo amor e amizade por mim.
Não foi meu último carnaval. Mas foi o primeiro que me deu a certeza de que não é fazendo cartilha que garantimos a felicidade.
Foi o primeiro que me enriqueceu de histórias que não são minhas e, no entanto, me fazem aprender de vida e superação.
Não foi só um Carnaval. Foi um grande encontro com várias formas que eu posso dar à minha vida.  E, em qualquer uma delas, ser feliz sem a menor preocupação de ainda continuar solteira!
Obrigada, meninas. Obrigada, Floripa. E ao Carnaval... Outra vez aprontando comigo, eu digo: - Valeu.
E depois do carnaval... Renovada fé. Reforçada paz. Revivida esperança. Restabelecidas certezas. Posto em dúvida a razão com sua briga constante com a emoção. E declarada a absoluta divindade que é VIVER! E ainda melhor: Conhecer pessoas!
Débora Andrade

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