terça-feira, 30 de outubro de 2012

Sem Ai, Nem Ui


Sem ai, nem ui.

Sem ai, nem ui. Foi assim que sempre seguiu a vida.

Aos três anos e meio, encantada com a fogueira e as histórias de pessoas que a cercavam,  calçava sapatinhos de lã e quis chegar mais perto. Claro que se machucou.
Das bolhas e dos cuidados excessivos do pai e da mãe, ficou a lição – quem brinca com fogo faz xixi na cama. Nem ligou para a bolha que cobria seu pequeno pé.
Desde pequenina tinha um certo fascínio pelas feridas e cicatrizes. Parece que previa que teria um monte delas quando crescesse. As feridas lhe deram a certeza de que viveu! E as cicatrizes, a certeza de que o tempo cura, mas não apaga.

Aos sete, enquanto brincava de ser she-ra com a irmã, deslizou no golpe que ela tinha certeza que poderia voar. Tirou os dois pés do chão e foi preciso apoiar com o braço. Das duas cirurgias e do braço imobilizado por quase três meses, ficou a lição – Voe alto. Mas voe para ver do céu o que é seu no chão. E nunca para golpear certeiro a fim de ferir alguém.

Subia em árvores, se aventurava entre patins, skates, bicicletas e carrinhos de rolimã.
Adorava a sensação do perigo, da velocidade e o frio na barriga valia até a bronca certeira da mãe.
Caiu muito. Se machucou tanto. Mas nunca deixou de viver a vida como uma brincadeira gostosa de criança. Do tempo que passou, as cicatrizes e nenhuma seqüela. Do que ainda lhe resta de quando criança? A coragem e o gosto bom de sonhar.
Hoje, apesar de saber que não é a she-ra ou nenhuma outra heroína, se salva todos os dias do desgosto destes dias sem poesia e frio na barriga.
E continua a se aventurar sem medo das feridas, pois sabe que um dia serão apenas cicatrizes carregadas de histórias que valeram a pena.
Débora Andrade

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